quarta-feira, dezembro 29, 2004

“Ordinary life is pretty complex stuff” – Parte I



“O cotidiano é um coisa muito complexa”: traduzindo mal e porcamente, esse é o slogan de “O Anti-herói Americano” (American Splendor), filme de Shari Springer Berman e Robert Pulcin (2003). Premiado em Sundance e Cannes, o filme retrata a vida (na verdade, a confusão entre a vida e a obra) de Harvey Pekar, um arquivista de Cleveland que um dia teve um insight atrás de uma velha judia na fila do caixa de um supermercado e virou “super-anti-herói” de quadrinhos. Essa é -- em linhas toscas, obviamente – uma maneira de resumir mal o filme. Ele é bem mais que isso.

Vale começar dizendo que o filme deve ficar 10 vezes melhor pra quem é fã de quadrinhos. Se estiver sendo lido por um aficcionado dos comix neste momento, peço perdão: até poucas horas atrás eu não sabia nem que Harvey Pekar existia como pessoa, nem como personagem, nem que era amigo de Robert Clump e nem que se casara com uma mulher muito esquisita. Digo mais, eu não fazia a menor idéia de quem era Robert Clump até pesquisar na Internet há poucos minutos. Ignorâncias admitidas, falemos do filme.

American Splendor cativou-me desde a primeira cena. Vamos a ela: Halloween, vemos crianças fantasiadas de super-heróis batendo à porta de uma mulher para pedir doces (algo tipicamente norte-americano). Dentre as crianças, há uma que se destaca por não usar fantasia alguma. “Quem é você”, pergunta a mulher surpresa, como se não compreendesse por quê a criança não usa fantasia. “Sou Harvey Pekar, moro aqui perto”, responde o menino (um aviso, não estou repetindo as frases textualmente, ok? usem a imaginação). Essa primeira cena nos põem e contato direto com o personagem e com o homem Harvey Pekar. Como se percebe no decorrer do filme, a arte de Pekar não é sobre animaizinhos ou super-heróis, mas sobre pessoas comuns, imersas num “cotidiano muito complexo”.

A abertura prossegue, mostrando os créditos, utilizando agora formato dos quadrinhos para apresentar a história e os personagens, ou melhor, os Pekars: o Pekar real (que participa do filme), o Pekar personagem do filme (interpretado por Paul Giamatti) e o Pekar personagem dos quadrinhos (no traço de Crumb). Já nesse ponto, o ordinário começa a ficar complexo.

Na seqüência, o espectador se depara com o homem Pekar num estúdio de gravação, gravando o off que vai apresentar o personagem de Paul Giamatti no filme: um Pekar sem voz, com um nódulo na garganta, prestes a ser deixado pela mulher. Esse movimento parece contribuir para dar a tudo um ar de normalidade. A presença de Pekar no filme é capaz de nos manter mais próximos do real.

Durante todo filme, o foco será deslocado de um Pekar para outro, fundindo dois deles (ou os três) em determinados momentos. Esse movimento é fascinante, porque diz da própria maneira como Pekar parece ver o que faz. No diálogo que tem com Crumb para apresentar a idéia de seu personagem (o roteiro que criou) Pekar bate sempre a mesma tecla: é preciso fazer algo que se pareça com a vida real. O filme parece não perder isso de vista em momento algum.

Gostei muito do filme. Ao contrário de muitos “obras primas” de Sundance, American Splendor não me pareceu pretensioso ou pedante. Diria eu que se trata de um filme que chega à originalidade em vários momentos sem forçar a barra, sem ter isso como meta. Mas isso é opinião minha. Assistaí e deixaquí sei pitaco.

Pra entrar no filme mais preparado do que eu entrei, vai aqui o endereço do blogue do Pekar. Ajuda a sacar como o filme captou bem a essência da figura.

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segunda-feira, dezembro 27, 2004

VOCÊ RECEBEU UMA MENSAGEM



Caros visitantes, devo dizer que estou sem inspiração. Por isso mesmo, escrevi um texto de três páginas que não diz coisa com coisa e fiquei com uma preguiça (e uma vergonha) imensa de postá-lo. Acho que vou apelar pra mais um poema e, se persistirem os sintomas, o texto ruim deverá ser postado. Espero não decepcioná-los com minha falta de inspiração (e de transpiração). É que outros mares têm sido navegados. E dessa vez acho que tá valendo a pena.

Quem estiver vivo, que apareça!


Abraços.


Psico


OBS: Acredito que, por convenção, eu deveria desejar feliz ou próspero ano novo pra todo mundo, mas há tempo pra isso... deixemos pra outra hora.

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sábado, dezembro 18, 2004

CAPITAL



Vivendo no interior,
sabia-se
descapitalizado.

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sexta-feira, dezembro 17, 2004

TEM ALGUÉM AÍ?

... é que eu estive meio distante, fui engolido por uma baleia. Não, não é o que vocês estão pensando. Falo de um outro tipo de baleira. O Leviatã, entendem? Não, não. Não o bíblico. Um outro. Digamos que se trata de um Leviatãzinho. É, é, é (eeeeeeeeeeeee!). Não falo do Estado. Falo de um estadinho. Um campinho cheio de regras onde tudo existe no diminutivo, mas pode ser tão letal quanto as macroestruturas. Sim, sim. Estanho mundo, esse das baleias menores. Elas te mastigam, te trituram e depois te cospem. Mas é cuspe ruim, entende, Pelé? Os dentes desse Leviatãzinho - dizem os lábios - não se chamam dentes, mas normas. Norma é nome aparentemente bondoso. Aparentemente. Norma é nome bom pra professora de português. Dona Norma. A Norma culta. A norma chata. Normal. Arg! A norma, ora pois pois.

E agora eu aqui. Escrevendo. Frases curtas. Que bom. Cansei dos parágrafos joyceanos. Saudade dos claricínios. É. Escrevo, não leio. o pau, come. Porrada. Batida. Pancada. Choque. Ó, cansei cansei, viu? Non sense. No way. No stress.

E é só.

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PSICOTÓPICOS E AS CONCLUSÕES

No início deste ano, criei o Psicotópicos, para dar vazão à minha produção intelectual e, ao mesmo tempo, encontrar pessoas dispostas a debater acerca de assuntos de meu interesse -- fosse para criticá-los, fosse para complementá-los, fosse para concordar com eles. Na época, eu chamava o Psicotópicos de “um rascunho virtual”.

Desde então, passei a andar mais atento, prestando mais atenção aos “mundos”, a fim de encontrar material passível de ser discutido no blogue, material capaz de apontar novos caminhos, alternativas.

Nesse percurso de lá até aqui, muito aconteceu.

Aos poucos, comecei a acompanhar a mídia tradicional de forma crítica para comentá-la no Psicotópicos. Nesse processo, o interesse pela Folha de São Paulo e, particularmente, pelo o hiato apresentado entre o discurso (imagem?) da Folha e sua prática foi aumentando.

Esse interesse é compreensível por vários motivos. Dentre eles, gostaria de destacar um. Quando cursava terceiro período do curso de jornalismo, fiz parte de um grupo de estudos críticos que tinha como objetos de estudo a coluna do ombudsman da Folha e o site do Observatório da Imprensa. Foi nesse período que meu olhar crítico em relação à imprensa foi, aos poucos, ficando mais aguçado. De certa forma, o Psicotópicos serviu para confirmar essa tendência.

Deve-se dizer que, a princípio, o objetivo de meu TCC era tratar do já mencionado hiato entre o discurso da Folha e sua prática. Contudo, em função de alguns atropelos -- dentre os quais a troca de orientador -- fui sendo forçado a limitar meu tema cada vez mais, terminando por excluir o ombudsman. Mantive a Folha para analisa-la em seu caráter de empresa jornalística, incluindo um novo objeto de análise, para fins comparativos – as mídias digitais.

A escolha das mídias digitais tem a ver com as reflexões desenvolvidas aqui no Psicotópicos acerca do próprio Psicotópicos – enquanto mídia alternativa de suporte gratuito – e da Internet enquanto espaço público potencialmente livre de impedimentos.

Aos poucos, o tema foi sendo expandido em alguns sentidos -- e restringido em outros. Muitos ajustes foram necessários. A análise da Folha foi cedendo espaço para uma análise da empresa jornalística no contexto brasileiro. A Folha de São Paulo foi substituída pela Folha Online. O site independente escolhido para servir de contraponto, para o exercício comparativo, passou do Repórter Social para a Agência Carta Maior. O número de matérias a serem analisadas foi reduzido a quatro (duas de cada site) e os critérios para análise restringidos ao número de três. Por último, foi escolhido um tema único, comum a todas as matérias analisadas: o assassinato dos moradores de rua em São Paulo no período de agosto a setembro de 2004.

Mais uma vez, o Psicotópicos foi determinante nesse processo: eu abordara esse assunto no blogue em três oportunidades.

Se a Agência Carta Maior, no contexto do TCC, surgiu como um veículo mais livre, mais habilitado para informar de forma mais aprofundada acerca de temas que escapam aos critérios de escolha de notícias adotados pelos meios jornalísticos tradicionais, os blogues parecem levar essa possibilidade de independência ao extremo.

Não se deve, em hipótese alguma, ignorar o fato de que a Internet também tem suas limitações. Contudo, não se pode dizer que, hoje em dia, ela pode representar um espaço livre de pressões de nível sistêmico (pelo menos objetivamente, já que não se pode medir de forma precisa os nível de subjetivação dos valores sistêmicos por parte dos sujeitos envolvidos numa interação dialógica via web/blogue). Contudo, acredito que, ainda assim, a web representa uma avanço no sentido de uma democratização dos meios.
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Em todo esse movimento, algumas leituras estabelecidas durante os quatro anos de faculdade foram fundamentais. Harvey, lido no primeiro período, serviu para me colocar em contado com os conceitos de modernidade e pós-modernidade (com toda o grau de incerteza que ele representa). Bourdieu, no segundo período, começou a descortinar os mecanismos sutis que tornam o campo jornalístico algo extremamente complexo de ser analisado. O casal Mattelart me fez atentar para um possível retorno do sujeito como paradigma comunicacional na contemporaneidade. Pierre Levy, lido com algumas ressalvas no terceiro período, serviu para suscitar algumas reflexões acerca das novas tecnologias.

Habermas, lido no quarto período, me fez pensar a razão de uma forma diferenciada. Foucault, lido “por fora” no decorrer do curso, alertou-me para as “interdições” dos discursos, para a microfísica do poder e para o valor das resistências localizadas. Lyotard e Wittgenstein me puseram em contato com a teoria dos “jogos de linguagem”.

Nesse movimento, que inclui ainda leituras diversas, que vão desde Geertz até Guimarães Rosa, foi surgindo uma nova forma de olhar para o mundo e muitas portas foram abertas. Agora é hora de lançar novos olhares sobre as portas abertas. Creio que o trabalho de conclusão de curso, ora concluído, será um ponto de partida interessante.

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domingo, dezembro 12, 2004

REFLEXÃO SOBRE NADAS, SUBIDAS E ESCADAS

O poema abaixo foi escrito por Orlando Lopes, poeta capixada e, coincidentemente, meu amigo. Além de excelente, o poema vai de encontro a algumas discussões iniciadas pela Laura, no Terra à Vista, a partir de poemas de Manuel de Barros e "otras cositas". Carissa, Rinogas e eu também insinuamos reflexões nesse sentido, portanto, aproveito o momento favorável pra colocar mais lenha na fogueira. Let it burn!!!



UMA ESCADA SOBRE O NADA
Orlando Lopes

A escada, apenas entrevista

imagine
uma escada
tão leve
que possa-ser
-lhe permitido
o luxo
de equilibrar-se
sobre o nada

devem ser veros e certos
os muitos rodopios
que a escada dá
sobre si mesma
presa que está
apenas
ao infinito

seu maior mistério
é ter a substância
do nada
mas ainda assim
ter um quê
ao menos um
algo a mais
quase-sal
quase-pimenta
mesmo sopitados
na carapinha
de um-só (o significado)

:

fiat luz (a vontade iluminada
vejamos
a escada)

...

uma escada
descarnada de tudo
o que não seja escada
(a escada ainda
antes
de ser realizada)

...

estando sobre o nada
tanto os degraus
quanto a própria dita
dão igualmente
para outro nada
(o mesmo) e para
outros (os nada alheios)
nadas (: nossos com
parsas)

um
de
grau
acima ou
abaixo

de nada

leva a escada para
nenhum lado

: fora do nada
pode-se apenas andar
de um lado para o outro
dentro da escada

: dentro do nada
nada se passa
a não ser um degrau
em relação aos outros

assim
de dito em desdito
os que a vêem
a usam (a escada)

sobem e descem
atravessando de
ponta a ponta os
limites do nada

...

nos altos e baixos
do nada
sacodem-se em
seus falsos fios
as paspaisagens
surreais
: milhares
de
degraus

de uma única (a múltipla
e infinita) escada


A escada em su sitio

sendo feita essencialmente
de nada
será possível perguntar: “mas
e o que-é que-é-que se poderá
enfim
fazer com essa escada?
de onde e para onde poderá
transportar estes olhos
que assaltam incessantes
o redivivo nada?

sendo em seu íntimo
feita de nada
esta será sem dúvida
sua única herança certa
: tudo o que a escada pode
oferecer, quando desnudada
é o próprio nada

sua metafisiologia,
sua amorfologia,
sua tópica ausente,
sua típica ausência,
sua arritmia indisfarçada

: fora de todo o tempo
(pouco antes de existir
e funcionar a matéria

:

nesse momento melhor
se mostra (e di
vaga) a escada
que só existe (de facto)
enquanto é
nada: quando
vira coisa
ela é só – apenas –
impressão : aparência
degenerada)
: fora de todo o espaço


A escada e sua demanda

a escada (também
chamada antes
graal alavanca nirvana

epi phainós
meta physis
ais thesis


mundo que se desmove
em puro comovimento)

manda e desmanda
no poder que a comanda
: é a força da vontade
que declina (e desdenha)
do nada

(pois com ele se afina
e nele se afaga)


Dos usos humanos para a escada

há que se ter cuidado
ao se pretender usar
uma escada que apenas
pode nos levar do nada
ao nada: qualquer coisa
a mais
perigará o limite
de uma existência
tão inegável
quanto discutível

(será sempre tão palpável
quanto se puder provar
– em caso contrário
tornará sua solidez a
se desmanchar no ar –

e assim, insistindo
em existir, não hesitará
em barbarizar tribunos,
admoestar jurados

: quando o nada encontra
a vontade
o mundo se encontra
dado:

acaso acasalado
sentido reencontrado.

Abaixo, um micropoema cometido por mim tempos atrás...



SUBIDAS

De longe,
a escada ria
da gente.

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quarta-feira, dezembro 08, 2004

“SÓ NÃO FALAMOS A MESMA LÍNGUA...”



Se tem uma coisa de que não gosto é de me meter em polêmicas. Fujo delas como o diabo da cruz. Mas elas me perseguem. Quando menos espero, dou de cara com elas, me esperando na esquina de uma frase atravessada.

Polêmicas são boas para colocar certos assuntos incômodos em discussão. Muitas vezes só se consegue chamar a atenção das pessoas dessa forma –polemizando. O Paulo Francis fazia isso como ninguém (na verdade, ganhava a vida assim). O Jabor faz isso às vezes. O Diogo Mainardi (eca!) garante assim a sua coluna semanal na Veja, uma das revistas mais desprezíveis da imprensa brasileira (na minha modesta opinião).

Dependendo do assunto levantado, vale a pena polemizar. Mas muitas vezes, isso só cria confusão, só faz levantar poeira. Todos gritam, berram, “bradam” e nada se resolve. Fica nisso. O giramundo continua. As palavras ganham peso e a vida, o mundo, a humanidade é posta de lado.



O Rino escreveu essa semana um texto sobre a censura. Criticando os comentários bobo/idiotas que as pessoas deixam nos blogues, Rino admitia que sentia vontade de proibir essas pessoas de escreverem. Segundo ele, tudo em nome do “bom gosto”. “Por deus, proíbam todos! Proíbam sim, mandem prender, mandem pro inferno, quebrem todos os dedos para nunca mais poderem digitar. Salvem o mundo dessa cretinice desvairada. Nem que para isso eu tenha que perder um direitozinho aqui e outro acolá. Eu aceito. Censurem tudo, censurem sim!”.

É claro que, em nome do estilo, às vezes comprometemos a capacidade expressiva de nossos textos. Rino tem um dos blogues que mais tenho visitado ultimamente. Mesmo que eu discorde do conteúdo do texto, devo admitir que ele escreve brilhantemente. Ao contrário de Marcelo Tas, aquele que apresenta um programa chamado Vitrine, na TV Cultura de São Paulo. Ontem, em seu blogue, com um texto muito do ruinzinho (na linha “cool”), Tas criticava os turistas que lotam São Paulo nessa época de final ano e que, segundo ele, são os culpados pelos engarrafamentos. Lá ele diz:

“Nessas malditas 4 semanas do mês de Dezembro, saio de casa com ímpetos de serial killer (atenção pessoal, isto é uma piada!!!) olhando as placas dos carros. Só tem gente de fora. Faça o teste você também. Cuiabá, Londrina, Curitiba, Floripa, Balneário Camboriú, Belzonte e até os cariocas invadem a cidade. Congestionando as lojas e as ruas. Não me levem a mal, queridos visitantes, mas sou favorável que nesta época SP deveria exigir visto para entrar na cidade. Ou pelo menos pagar pedágio. Com renda revertida para um drink no final da tarde para os habitantes estressados dessa megalópole”.

Tudo bem, né? Afinal, o blogue é do cara, ele está só expressando sua opinião. Tudo bem se não estivéssemos falando de alguém que é lido por muita gente. Sabe-se lá quanta gente encara como verdade universal os bairrismos do Sr. Tas. Talvez assustado com a chuva de críticas (algumas naturalmente exageradas), Tas voltou a tocar no assunto, reproduzindo num “post” os comentários mais agressivos. Achei engraçada a atitude do apresentador/blogueiro. Fico me perguntando: como alguém que trabalha com comunicação perde assim a noção do impacto e amplitude que seus desabafos precipitados podem ter?

Fui lá e, usufruindo as benesses que a interatividade “internética” oferece, comentei:

“Tas, tá certo que houve simplismo por parte de alguns comentaristas, mas você deve admitir que seu texto foi um tanto quanto impensando. Fosse você um blogueiro qualquer, até entendo o inconformismo. Mas você é um comunicador. O que você fala tem peso diferente. Quando você defende uma "São Paulo para os paulistas" com tanta determinação está automaticamente desdenhando uma imensa parcela de brasileiros que visitam o seu blogue, que lêem o que você escrevem e dão importância a isso. Não é uma questão de não saber ler. O fato é que um texto superficial, repleto de lacunas, abre margem a uma série de interpretações. Pro seu azar, a maioria é desfavorável. Pessoalmente, acho que você "enfiou os pés pelas mãos". Os holofotes estão em você. Aprenda a conviver com as sombras que você projeta. É isso. Não comento por mal não, viu Tas? Se quiser, pode me ignorar. Mas já que você fala o que quer, precisa ouvir o que não quer de vez em quando. ´mabraço”.

A Laura também passou por lá (antes de mim) e também comentou:

“Tas, não creio que tenha havido um problema de boa leitura, mau humor ou de falta de elegância, pelo menos de minha parte. O texto está de fato muito agressivo, mas isso acontece, não acredito que você seja facista ou nazista, claro que não. Apenas acho que você exagerou na dose de ironia. Sei lá. Veja, se eu que sou paulistana me incomodei com o que estava escrito, imagine quem é de outros estados e cidades. Abraços e pretendo continuar vindo a esse espaço, gosto daqui. E, meu caro, um viva ao pensamento dialógico ! : )Bem, é isso”.



Tenho insistido na questão de que palavras têm diferentes pesos, dependendo contexto em que são proferidas. A palavra escrita, por si só, tem mais peso que a palavra falada. Os escritos do Tas (por menos importante que ele seja) têm mais peso que os meus ou o os da Laura. E assim por diante.

Apesar de discordar absolutamente do que Tas escreveu, não tenho o direito de exigir que ele se cale. O mínimo que posso fazer é explorar o terreno pra ver se é possível estabelecer algum contato com este outro que ele representa.

Falo em testar terreno porque nem sempre é possível estabelecer contato com as pessoas. É difícil tirar os olhos do próprio umbigo. Interpretamos as mensagens de acordo com o repertório cultural de que dispomos, de acordo com o que o antropólogo Clifford Geertz chama de “rede de significados”. O diálogo só acontece realmente quando os envolvidos se predispõem a compreender em que “rede” o outro opera. Quando isso não acontece, o encontro não acontece.

***

Vale retomar aqui a conversa sobre o Rino. Em seu blogue, depois da “celeuma” criada em torno do texto sobre a censura, ele escreveu um outro, intitulado “Sobre dignidade e palavras demoníacas”, no qual falava de como as pessoas reagem a determinadas palavras, como “hegemonia”, “censura”, “fascismo” – como se fosse pecado falar desses assuntos. Essa “sacada” de Rino é fundamental. Interdições como essas também prejudicam o diálogo. Toda interdição atrapalha os encontros.

Mas, tão grave quanto demonizar tais palavras é trabalhar com elas de forma superficial, relegando-as a um gueto, como se pertencessem apenas ao repertório de marxistas e revolucionários. Isso é “sujar” a palavra (pra fazer referência a Viviane Mosé). É tornar a palavra vazia. Nesses casos, cabe o meio termo: nem peso demais, que nos impeça de dizer; nem leveza excessiva, que nos faça distorcer.

Outro ponto importante é a maneira como as pessoas se agarram às suas verdades e esquecem que há outras formas de ver o mundo que não são menos verdadeiras, apenas diferentes.

De resto, já disse mais disso no texto que fala sobre a questão da memória e sobre como muitas vezes construímos nossas certezas com base em recortes do real.



Antes de acabar, queria só dizer uma coisa. Discutir apenas a partir de textos é ao mesmo tempo bom e injusto. Bom porque permite analisar os pontos de vista com mais calma. Injusto porque geralmente eles não nos dizem muito de quem está do outro lado. Esse quebra cabeças que a gente monta juntando os pedaços que encontrados nas entrelinhas é/não é o autor. A vida é mais complexa que isso.

***

Por hoje, já escrevi demais. Não acredito que algum herói tenha viajado até aqui. Se sim, espero que tenha feito boa viagem. Nossa mensagem de boas vindas vem em forma de música. Aproveitem a estadia!



O MUNDO
(Lenine, Paulinho Moska, Zeca Baleiro e Chico César)

O mundo é pequeno pra caramba
Tem alemão, italiano, italiana
O mundo filé milanesa
Tem coreano, japonês, japonesa
O mundo é uma salada russa
Tem nego da Pérsia, tem nego da Prússia
O mundo é uma esfiha de carne
Tem nego do Zâmbia, tem nego do Zaire
O mundo é azul lá de cima
O mundo é vermelho na China
O mundo tá muito gripado
O açúcar é doce, o sal é salgado
O mundo caquinho de vidro
Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo tá muito doente
O homem que mata, o homem que mente
Porque você me trata mal
Se eu te trato bem
Porque você me faz o mal
Se eu só te faço o bem


Todos somos filhos de Deus
Só não falamos a mesma língua..
Everybody is filhos de God
Só não falamos a mesma língua ...
Everybody is filhos de Ghandi
Só não falamos a mesma língua..
Todos somos filhos de Deus
Só não falamos a mesma língua..

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sexta-feira, dezembro 03, 2004

PASSEIO NA PRAÇA

O Psicotópicos andou meio paradão essa semana, mas o mundo continuou girando. Já estamos bem adiantados no planejamento do Cuspe e, no máximo semana que vem, é possível que todos os itens importantes já estejam decididos.

Não sei se vocês perceberam, mas criei uma alternativa aí no topo do blogue para colocar o link do pessoal que "cospe conversa" por aqui. Confiram.

E já que o lance desse "post" é ser altruísta, entrem comigo na campanha "Por uma Praça Verdadeiramente Nossa" e visitem a Praça do Zé. Postei lá um texto sobre o PT (esse assunto sempre rende) e gostaria que os Psicoleitores passassem por lá pra ler e cuspir com a galera da praça.

Bom por hoje é só, pe-pessoal.

Aproveitem o fim de semana e sejam felizes.

´mabraço.

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