"OS SONHOS SÃO SEMPRE PEQUENOS"
Estava lendo o livro "Inventário das Sombras", do curitibano José Castello. O livro é constituído por uma série de textos sobre escritores - detendo-se mais sobre suas as figuras, muitas vezes complexas e enigmáticas, do que propriamente em suas obras. Dentre os textos, há um sobre Saramago onde o autor escreve: "Saramago não gosta da lágrima fácil. Vê em seus compatriotas, ainda, um apego desmesurado pelas miudezas. Os sonhos são sempre pequenos, as ilusões sempre pequenas, as esperanças sempre pequenas. ´Tudo fica nessa pequenez. E os sentimentos também ficam aí, limitados, autocontemplando-se´".
Ao ler esse texto, pensei em Guarapari. Retomei um pouco daquele desabafo do post “CANSEI!” e comecei a desconfiar que a cidade tem muito disso: autocontemplação, pensamento pequeno, apego desmesurado pelas miudezas. Guarapari, como Portugal, ficou no meio do caminho. As promessas de grandeza se perdem num passado glorioso que se descobriu efêmero, passageiro. A “Cidade Saúde” adoeceu na velhice. Cansou (como eu cansei dela).
Os políticos que pontuam a história (e o presente) de Guarapari também guardam em si algo dos governantes portugueses de outros tempos, alheios à realidade d´além corte. Se Guarapari não foi invadida por Mouros (que deram novas feições ao lugar), foi tomada de assalto por mineiros, cariocas, baianos, gaúchos; foi tomada por brasileiros errantes, que pareciam encontrar aqui as promessas que só a fronteira oferece.
E Guarapari é fronteira.
Como na fronteira, por aqui não há leis, não há ordem, mas há jeitos (no pior sentido da palavra). Há realidades outras que não a do sistema – que só existe em com suas características mais nefastas.
Como Portugal se agarra às esperanças que a União Européia reacende – ao mesmo tempo em se sente saudades do passado -, Guarapari crê na salvação que vem debaixo, do petróleo. E enquanto ele não chega, a cidade espera -- sentada sobre os próprios fracassos.
Mas este pode ser apenas um olhar amargo de quem, como um Saramago sem talento, também sentiu-se deslocado em seu lugar (embora não pareça, o Espírito Santo é, muito mais que o Rio Grande do Sul, o meu lugar). talvez eu esteja errado, afinal, Guarapari é, como escrevi em outra ocasião, uma cidade sem rosto, sem forma, uma cidade "por fazer": essa característica facilita as comparações, as metáforas, as analogias. Talvez meu olhar seja o de quem esperava mais e a quem as migalhas começam já não satisfazem. Talvez seja o olhar do ex-apaixonado que, para o qual a realidade se torna mais nítida e dá perceber o quanto silhuetas na parece da caverna são capazes de nos enganar.
Bom, acho que escrevi um texto melancólico...
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