CACHIMBÃO
Provara da fama, um dia – e do poder. As legiões, se arrastando aos seus pés, desdobravam-se em mesuras e que tais. Era homem simples, naquele tempo, mas guardava postura imponente. Sabia ser magnânimo como poucos. E disso muito gostava – ser magnânimo. Era uma das formas de exercer seu poder. A bondade, dizem os sábios, é uma das faces do poder...
... e perder o poder é uma das formas de perder-se. Com ele, assim foi. A força que exercia sobre os outros – aqueles outros que dele dependeram um dia – esvaíra-se com os anos.
Hoje? Hoje anda por aí, a arrastar sandálias rotas – a barra da calça, puída, sempre a tocar o chão. Guarda nos olhos azuis, um tanto desbotados, um brilho de estrela morta. Sua figura é simpática – tristonhamente simpática. Tratam-no condescendentemente. Respeitam-no, até. Mas por mais que façam, é sempre pouco perto do – ah, melhor não pensar nessas coisas.
Deu pra mendigar migalhas de atenção nos últimos dias. É feliz quando lhe dão o que deseja – mesmo quando disfarçam o enfado ao fazê-lo. Precisa se ouvir. Se cansado está é por conta de tanto silêncio. Sim, precisa se ouvir – mas falar sozinho é atestado de senilidade. Isso – isso ele não quer. Pena faltar-lhe a dignidade dos velhos elefantes. Deveria afastar-se e cantar – cantar pra subir de uma vez. Subir – há quanto tempo não sabe o que é isso...
E logo agora, com essa chuva – logo agora o fumo lhe falta.
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