quarta-feira, novembro 03, 2004

PSICOMENTÁRIOS SOBRE O RESULTADO DO 2º TURNO

Serra em São Paulo, Fogaça em Porto Alegre, Coser em Vitória. Venceram os nomes que se prestam a trocadilhos.

VITÒRIA EM VITÓRIA

Se em Porto Alegre a hegemonia do PT acabou, em Vitória quem cai é o PSDB. Pra quem não se recorda, em 2002 o partido tinha, além da prefeitura, comandada por Luiz Paulo, o Governo do Estado, nas mãos de José Ignácio. Na época, o crime organizado fez a festa. A queda do PSDB pode não significar revoluções, mas é uma brisa nova que empurra o barco em outra direção.

EM SÂO PAULO? NEM COM MARTA ROCHA!

Em São Paulo, a derrota petista já era (des)esperada. Artilharia pesada em cima da Marta prefeita, da Marta mulher e da Marta candidata. Não agüentaria o tranco. Nem se fosse Marta Rocha.

Não bastasse a blitzkrieg, teve a queimação de filme. Do apoio de Maluf o PT só ficou com o pior: a imagem negativa da figura. O voto dos malufistas que era bom, nem pensar. Pendeu todo mundo pro lado do Serra. Novos ventos – mas com cheirinho de mofo.

Mas, diz a língua, que a derrota não foi da Marta, nem do PT. Valdemir Garreta, secretário de Abastecimento e Projetos Especiais da prefeitura de São Paulo, contou “histórias que nossas babás não contavam” em entrevista à Folha: “Ontem eu estava na casa de uma amiga. Ela chegou para a faxineira dela e disse: "Você viu? A Marta perdeu". E a faxineira respondeu: "A Marta não perdeu nada. Ela continua rica, poderosa, bem casada. Quem perdeu fomos nós". Essa frase para mim resume o sentimento da periferia que votou na Marta”. Não é que o povo aprende?!

Mais histórias do Garreta...

Conservadorismo: “São Paulo é uma cidade historicamente conservadora e oposicionista. Vota em lideranças conservadoras. Basta citar o Maluf”.

Duda Mendonça: “A pessoa freqüenta o mesmo lugar há 17 anos, praticando contravenção. Na véspera da eleição, é presa com um aparato típico de quem vai prender um traficante perigoso. Havia lá 60 policiais armados com metralhadora, máscara ninja. Tudo dentro da lei, mas muito estranho”.

Mídia: “Eu só peço que a mídia trate o Serra com 50% do rigor com que tratou a Marta. A mídia esqueceu que houve o governo Pitta. Esqueceu da situação desastrosa da cidade quando assumimos. E a mídia foi um dos instrumentos de reforço do preconceito contra a Marta. Setores da mídia trataram a Marta com uma agressividade impressionante. Quero ver se os repórteres vão enfiar o gravadorzinho na cara do Serra e perguntar: "Prefeito, fomos no posto de saúde e tem gente jogada na fila". Isso serve para a Folha, serve para o "Estado", serve para o conjunto da mídia”.

E o Gaspari, aquele da ditadura pseudo-escancarada?...

Criticou o governo e elogiou um PT...

O que falta ao PT Federal é a centelha do olhar dos militantes que em eleições passadas iam felizes para rua, sacudindo bandeiras”. “Não há em Brasília hierarcas curiosos para discutir as minúcias técnicas do bilhete único de transporte. Passaram-se quase dois anos de governo e o Ministério das Cidades não conseguiu botar de pé um programa de legalização dos lotes urbanos dos brasileiros que vivem nas grandes cidades. Foi a centelha da velha militância quem fez o bilhete único, os uniformes escolares e as mochilas da garotada pobre de São Paulo. Eram pessoas que pretendiam mudar o Brasil, não suas vidas. É dessa gente a monumental vitória petista na periferia da maior cidade do país. Uma vitória que marcará a história de São Paulo por muitos e muitos anos”.

Falô e alfinetô! Mas valeu...

De longe ou de perto?...

Quem alfinetô também foi a vencedora do PT, em Fortaleza, Luizianne que, de longe, tem cara de Heloísa Helena mas, de perto... de perto ninguém é normal! Vamos ao que ela disse...

"Eu acho que o partido tem que investir mais na base militante. Nós temos que voltar às plenárias de base, voltar à política de cada vez mais unir o partido para decidir as coisas. É, na verdade, radicalizar a democracia, inclusive para o bem desse governo"."Afinal de contas, só não faz uma autocrítica quem acha que não erra. Ou seja, alguém que não existe".

Só vale dizer que o PT faz auto-crítica, sim. Quem não faz são alguns políticos petistas (e o número deles é grande...).

PORTO ALEGRE? QUEM DISSE?!

Em Porto Alegre, rolou o inverso do que houve em Vitória. Por lá, rolou a cabeça do Raul Pont.A direita, essa sim, enrolou direitinho e, pelo jeito, vai jogar algumas crianças fora junto com a água do banho. Uma delas é o Fórum Social Mundial.

"Deixou de haver sentido Porto Alegre ser a sede permanente, o que sempre defendi”, disse o sociólogo Emir Sader, coordenador do evento. “Por mais bonita que seja a cidade, não foi isso que nos atraiu, mas a natureza das administrações públicas. Não é revanchismo, mas perdeu sentido ficar em Porto Alegre. Belo Horizonte, Recife e Salvador já se ofereceram."

E PRA CONCLUIR (até parece)

... um textinho do Emir Sader sobre o PT...

O PT derrotou a si mesmo
Emir Sader
Dois anos depois da vitória de Lula, que finalmente chega à presidência do Brasil depois de quatro tentativas, o PT tem o pior resultado eleitoral de sua história, impondo uma dura derrota à esquerda brasileira.
Uma derrota dessas proporções não se improvisa. Foi meticulosamente preparada ao longo do tempo. Dois anos depois da vitória de Lula, que finalmente chega à presidência do Brasil depois de quatro tentativas, o PT tem o pior resultado eleitoral de sua história, impondo uma dura derrota à esquerda brasileira. Produziu-se o pior dos cenários possíveis: um governo que não é de esquerda, que não saiu do neoliberalismo, é vítima do monopólio privado da mídia alimentado pelos seus recursos, perde todas os conflitos no poder judiciário e enfrenta uma aliança de partidos que o isola politicamente. Se se estivesse realizando um governo de esquerda, seria de se prever esse isolamento, mas com um governo que faz todas as concessões às elites tradicionais, o resultado não poderia ser pior. O governo Lula e a direção do PT aparecem como os grandes organizadores das derrotas sofridas pela esquerda nestas eleições. O governo, pela política econômica neoliberal e pelo discurso liberal, e a direção do PT, por ter anestesiado o partido e a militância, fazendo com que o partido perdesse sua alma. (Pela primeira vez em sua história, a onda final das eleições foi contrária ao PT. A tal da "profissionalização" fez da ação do PT algo indissociável à de outros partidos, substituindo os militantes por gente contratada para cumprir funções.) A grande aliança nacional com o PMDB se esboroou. A oposição, na lona até dezembro do ano passado, ganhou novo oxigênio, propiciado pelo governo e remontou um arco de alianças políticas que não pensava ter, dado de presente pelos erros do governo e da direção do PT. O PT preparou sua derrota, ao assumir a ideologia e a política liberal. Não bastou para cooptar a oposição a nível local, porque neste plano prima o melhor do PT - as políticas sociais - e isso as elites tradicionais detestam. O apoio que dão ao governo federal vem de sua política econômica, ausente dos governos locais. A luta da esquerda hoje - dentro e fora do PT - é contra a hegemonia liberal dentro do governo. Caso esta prevaleça, a esquerda como um todo terá sido derrotada. Os caminhos desta luta podem ser distintos conforme a inserção de cada um, de cada movimento social, conforme a localidade e o setor social onde se situem. Mesmo os que considerem que se trata de uma batalha perdida, a luta contra a hegemonia liberal é um processo inevitável de acumulação de forças, porque o liberalismo penetra profundamente em quase todos os poros da sociedade e da prática política e cultural brasileiras. Sem um combate frontal a essa influência, não teremos no Brasil uma esquerda à altura das necessidades da construção de um modelo pos-neoliberal. A construção de uma ampla frente antineoliberal é a forma de lutar pelos ideais do Fórum Social Mundial no nosso país, para que Porto Alegre não seja apenas um quadro na parede.

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