"AS RAZÕES DO ILUMINISMO": idéias suscitadas
HABERMAS E FOUCAULT
Num “post” anterior, citei o pensador alemão, da Escola de Frankfurt, Jürgen Habermas para falar sobre a invasão da justiça à vida privada das pessoas – às esferas do “mundo vivido”. Curiosamente, após ter escrito o texto em questão, iniciei a leitura de “As razões do iluminismo”, livro de ensaios de Sérgio Paulo Rouanet. Num dos capítulos do livro, está um ensaio que trata das afinidades e distâncias entre os pensamentos de Habermas e Foucault, dois autores sobre os quais Rouanet já publicara livros indepentes, a saber: “O homem e o discurso - a arqueologia de Michel Foucault”, sobre Foucault; e “Habermas”, sobre Habermas, este escrito com a colaboração de Bárbara Freitag, uma das maiores especialistas sobre a Escola de Frankfurt no Brasil.
Há algum tempo tentei – com bem menos competência – aproximar Habermas de Foucault. Na época, pretendia mostrar como as “interdições” do discurso, das quais Foucault fala em “A ordem do discurso”, podem ser obstáculos à realização plena da “ação comunicativa”, que pressupõem um diálogo aberto, que vise o entendimento mútuo. Além dos conceitos de interdição e de ação comunicativa, eu usava também o conceito de “campo”, de Pierre Bourdieu. Enfim, uma verdadeira salada teórica que muitas vezes se aproxima e noutras, se afasta.
Os ensaios Rouanet caíram como uma luva em meus delírios e apontaram caminhos para aproximar estes pensadores de forma mais organizada, sem os “buracos”, os “calcanhares de Aquiles” que permitiriam aos críticos acabarem comigo (nem tanto por terem razão, mas por faltar a mim condições de demonstrar meu ponto de vista).
Num dos ensaios, intitulado “Poder e Comunicação”, Rouanet dedica-se, exclusivamente, a apontar as intersecções entre os pensamentos do alemão e do francês. Um dos primeiros pontos de afinidade encontrados por Rouanet são as leituras comuns entre os dois: Hegel, Kant, Nietzsche e Weber. Outro fator eram as temáticas semelhantes trabalhadas por ambos, como fala Rouanet: “enquanto pensadores críticos, ambos denunciaram a modernidade social e, enquanto herdeiros da modernidade cultural, de algum modo se relacionaram com ela, seja para completá-la, como Habermas, seja para desmascará-la, como Foucault”. Para Rouanet, vale resumir um pouco a história, as principais intersecções entre Habermas e Foucault eram: a crítica da sociedade, a crítica do saber e a crítica do sujeito.
Na crítica da sociedade, Foucault identifica os mecanismos de poder, de repressão, de controle, de vigilância e punição que permeiam toda a sociedade: é a “microfísica do poder”. Embora admita que essa vertente de crítica da modernidade em Foucault aproxime-o mais da “velha” Escola de Frankfut (Adorno e Horkheimer), é necessário dizer – e ele diz – que Habermas não ignorou esse aspecto da modernidade. Grosso modo, a invasão do “mundo vivido” (do cotidiano) pela racionalidade técnico-instrumental é basicamente isso: controle, repressão, vigilância e – digo eu – perda de espontaneidade por parte do ser humano.
Com relação à crítica do saber, Foucault denuncia as bases “não-científicas” da ciência, demonstra como por trás de todo o discurso científico se esconde uma vontade de poder – de conquista ou manutenção do poder. Habermas, por sua vez, também percebe isso, como mostra Rouanet, “para Habermas as ciências sociais podem ter uma função objetivante quando se relacionam com o mundo social segundo o interesse técnico, do mesmo modo como as ciências empíricas se relacionam com a natureza, segundo o mesmo interesse técnico. Deformadas pelo interesse técnico, as ciências sociais podem tratar as pessoas como se fossem coisas e nesse sentido ser apropriadas por estratégias de poder”.
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O último ponto das intersecções entre os pensamentos de Habermas e Foucault, a crítica so sujeito, deixarei para abordar num próximo “post”. Essa é uma parte que merece um pouco mais de atenção e, no momento, disponho de pouco tempo para isso.
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